Educação

Um convite a conversação e reflexões a respeito da educação de nossas crianças e jovens

Educar é um compromisso ético, pois, estamos lidando com seres humanos cujos valores e crenças foram sendo constituídos nos espaços de convivência familiar e sociais ao qual pertencem.

Educar não é apenas entulhar a mente dos nossos estudantes com conhecimentos lógicos e racionais como muitos apregoam. As pesquisas em neurociência já comprovaram que o racional está intimamente relacionado com o emocional.

[…] ao nos declararmos seres racionais, vivemos uma cultura que desvaloriza as emoções, e não vemos o entrelaçamento cotidiano entre razão e emoção que constitui o nosso viver humano, e não nos damos conta de que todo o sistema racional tem um fundamento emocional. (MATURANA,1999, p. 15)

Aqueles que defendem o aumento da carga horária nos currículos escolares, privilegiando as disciplinas das ciências exatas em detrimento daquelas que trabalham com o desenvolvimento humano, social e cultural, desconhecem as pesquisas mais recentes da neurociência e, por isso, propõe um retorno aos currículos de décadas anteriores como salvacionismo da educação brasileira.

É fundamental que os professores compreendam os mecanismos neurológicos que influenciam o sistema racional para que possam ajudar os estudantes que têm dificuldades de aprendizagem.

A região do nosso cérebro que comanda as nossas emoções, o sistema límbico, influencia as decisões racionais desencadeadas no Neocortex. Por isso, compreender esse mecanismo é importante para que possamos intervir e desbloquear o que impede nossas crianças e jovens de ter sucesso na aprendizagem escolar.

Além do conhecimento dos mecanismos cerebrais e das interligações do sistema racional e emocional que dizem respeito a “clausura operacional do nosso cérebro” (MATURANA, 2005, p.149), precisamos ampliar nossos conhecimentos a respeito de como nos constituímos enquanto seres humanos, na convivência social e na constituição da nossa cultura.

Sustento que aquilo que conotamos na vida cotidiana, quando falamos de cultura ou de assuntos culturais, é uma rede fechada de conversações que constitui e define uma maneira de convivência humana, como uma rede de coordenações de emoções e ações. (…) uma cultura é, constitutivamente, um sistema conservador fechado, que gera seus membros à medida que eles a realizam por meio de sua participação nas conversações que a constituem e definem. (MATURANA & ZOLLER, 2011, p.33)

Com base no conceito cunhado por Humberto Maturana e Ximena Dávila, sobre a constituição biológico-cultural do ser humano, infere-se a diferença que um educador que conhece essa dinâmica pode fazer na vida dos estudantes.

Maturana e Ximena denominam o entrelaçamento do biológico e o cultural de Unidade Ecológica Organismo-nicho (UEON). Segundo eles…

O viver do ser humano ocorre desde as suas origens em completa integração com o entorno conformando uma totalidade ecológica e dinâmica que denominamos Unidade Ecológica Organismo-nicho(…). Somos seres humanos unicamente no curso de nossa convivência com outros seres humanos. (MATURANA & DÁVILA, 2016, p.10)

Eles ainda afirmam que no momento em que surge o ser vivo aparece junto com ele, o “nicho” que o faz possível constituindo-se assim, a unidade ecológica organismo-nicho como podemos visualizar no diagrama abaixo.

Se organismo e nicho se transformam na convivência, conhecer e entender tem a ver com a realização do viver do organismo e não com uma suposta realidade transcendente, por isso a relevância de uma educação que coloque o “entendimento” e não o “saber” no coração de nosso fazer. Isso posto podemos compreender a importância do acolhimento ao outro e o respeito ao outro como legítimo outro na convivência.

Quando se compreende que o mapa que representa a percepção de mundo de cada um depende da dinâmica da unidade ecológica organismo-nicho, entende-se que temos tantas percepções quantos forem esses organismos-nicho e aí surge o espaço para o acolhimento à diversidade.

Ter o entendimento de que somos seres biológico-cultural imersos numa cultura de dominação e submissão nos leva a concluir de que a dor e o sofrimento são sempre de origem cultural.

Ximena nos diz que a dor cultural é por uma falta de consciência ética, portanto, falta de amor.

E o que isso tem a ver com a Educação? Compartilhar com vários estudantes o ambiente escolar, significa acolher os diferentes mapas mentais constituídos de valores e crenças diversas, para com isso construir um ambiente de acolhimento com base no amor.

O melhoramento das relações humanas ocorre em processos de ampliação de um conversar colaborativo, no respeito ao pensar diferente, do outro, só assim legitimamos a diversidade cultural.

A escola é local adequado para exercitarmos com os nossos alunos esse respeito ao outro como legítimo outro na convivência, pois, como seres humanos, assim nos tornamos, vivendo e convivendo em organizações ou comunidades que realizamos com nossas conversações.

Como podemos transformar a escola num espaço de conversações que possibilite liberar um estudante da armadilha da dor e do mal-estar da depreciação de si mesmo?

Depreciação gerada na sua história de convivência com adultos com quem convivi ou conviveu e que o negam ou negaram no desamor. Como ajudar esse estudante a encontrar-se com o respeito por si mesmo?

Fica aqui o convite para ampliarmos as redes de conversações com os estudantes, pais e toda a comunidade escolar, para transformar uma cultura de dominação, submissão e controle, para modos de conviver baseados na confiança, na harmonia, no bem-estar do mútuo respeito, na honestidade e na colaboração.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
MATURANA, Humberto Rosemin & DÁVILA, Ximena Yáñez. El Arbor del Vivir. Chile: MVP Editores, 2013.

MATURANA, Humberto Rosemin & VERDEN-ZOLLER, Gerda. Amar e Brincar: os fundamentos esquecidos do humano. São Paulo: Palas Athena, 2011.

MATURANA, Humberto Rosemin. A Árvore do Conhecimento: as bases biológicas da compreensão humana. São Paulo: Palas Athena, 2005.

__________________________. Emoções e Linguagem na Educação e na Política. Belo Horizonte: Editora UFMG, 1999.

Ivane Duvoisin